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terça-feira, maio 23, 2006

Coisas do Sistema ou a Fábula dos Porcos Assados

A FÁBULA DOS PORCOS ASSADOS

Certa vez, houve um incêndio num bosque onde estavam alguns porcos, que
foram assados pelo fogo. Os homens, habituados a comer carne crua,
experimentaram e acharam deliciosa a carne assada. A partir daí, sempre que
queriam comer porco assado, incendiavam um bosque! Mas deparavam-se com
alguns problemas, que, no entanto, sempre foram sendo resolvidos com
sucessivos aperfeiçoamentos, criando-se um grande SISTEMA que funcionou
durante anos.

A dada altura, as coisas não iam lá muito bem: às vezes os animais ficavam
queimados demais ou parcialmente crus. O processo preocupava muito a todos,
porque se o SISTEMA falhava, as perdas ocasionadas eram muito grandes:
milhões eram os que se alimentavam de carne assada e também milhões os que
se ocupavam da tarefa de assá-los.

O SISTEMA simplesmente não podia falhar. Mas, curiosamente, quanto mais
crescia a escala do processo, tanto mais parecia falhar e tanto maiores eram
as perdas causadas.

Devido às inúmeras deficiências, aumentavam as queixas. Já era um clamor
geral a necessidade de reformar profundamente o SISTEMA. Congressos,
seminários e conferências passaram a ser realizados anualmente para
encontrar uma solução. Mas parece que não acertavam na melhoria do SISTEMA.
E assim, todos os anos se repetiam os congressos, seminários e conferências.

As causas do fracasso do SISTEMA, segundo os especialistas, eram atribuídas
à indisciplina dos porcos, que não permaneciam onde deviam, ou à inconstante
natureza do fogo, tão difícil de controlar, ou ainda às árvores,
excessivamente verdes, ou à humidade da terra, ou ao serviço de informações
meteorológicas, que não acertava no lugar, no momento e na quantidade das
chuvas, etc...

As causas eram, como se vê, difíceis de determinar! Na verdade, o sistema
para assar porcos era muito complexo. Era uma grande estrutura: maquinaria
diversificada, indivíduos dedicados exclusivamente a acender o fogo -
incendiadores - que eram também especializados: incendiadores da Zona Norte,
da Zona Oeste, etc., nocturnos e diurnos, com especialização em matutino e
vespertino, de verão, de inverno, etc. Havia especialistas também em ventos
- os anemotécnicos. Havia um Director Geral de Assamento e Alimentação
Assada (DGAAA), um Director de Técnicas Ígneas (DTI, com o seu Conselho
Geral de Assessores), um Administrador Geral de Reflorestação (AGR), uma
Comissão Nacional de Formação Profissional em Porcologia (CNFPP), um
Instituto Superior de Cultura e Técnicas Alimentícias (ISCUTA) e o Bureau
Orientador da Reforma Ígneo-operativa (BORI).

Tinha sido projectada e encontrava-se em plena actividade a formação de
bosques e selvas, de acordo com as mais recentes técnicas de implantação,
utilizando-se regiões de baixa humidade e onde os ventos não soprariam mais
do que três horas seguidas.

Eram milhões de pessoas a trabalhar na preparação dos bosques, que depois
seriam incendiados. Havia especialistas estrangeiros estudando a importação
das melhores árvores e sementes, fogo mais potente, etc. Havia grandes
instalações para manter os porcos antes do incêndio, além de mecanismos para
deixá-los sair apenas no momento oportuno.

Foram formados professores especializados na construção destas instalações.
Investigadores trabalhavam para as universidades que preparavam os
professores especializados na construção das instalações para porcos;
fundações apoiavam os investigadores que trabalhavam para as universidades
que preparavam os professores especializados na construção das instalações
para porcos, e por aí fora.

As soluções que os congressos sugeriam eram, por exemplo, aplicar
triangularmente o fogo, depois de atingida determinada velocidade do vento,
soltar os porcos 15 minutos antes do incêndio médio da floresta atingisse 47
graus, posicionar ventiladores gigantes em direcção oposta à do vento, de
forma a direccionar o fogo, etc.

Não é preciso dizer que poucos especialistas estavam de acordo entre si, e
que cada um baseava as suas ideias em dados e pesquisas específicos.

Um dia, um incendiador categoria AB/SODM-VCH (Acendedor de Bosques
especializado em Sudoeste Diurno, Matutino, com bacharelato em Verão
Chuvoso), chamado João Bom-Senso, pensou e disse que o problema era muito
fácil de ser resolvido: bastava, antes de tudo, matar o porco escolhido,
limpando e cortando adequadamente o animal, colocando-o então sobre uma
armação metálica sobre brasas, até que o efeito do calor, e não as chamas,
assasse a carne. Informado sobre as ideias do funcionário, o Director Geral
de Assamento mandou chamá-lo ao seu gabinete e depois de ouvi-lo
pacientemente, disse-lhe:

- Tudo o que o senhor disse está muito bem, mas, na prática, não funciona. O
que faria, por exemplo, aos anemotécnicos, caso viéssemos a aplicar sua
teoria? Onde seria empregado todo o conhecimento dos acendedores de diversas
especialidades?

- Não sei - disse João Bom-Senso.

- E os especialistas em sementes? Em árvores importadas? E os projectistas
de instalações para porcos, com as suas novas máquinas purificadoras
automáticas de ar?

- Não sei.

- E os anemotécnicos que levaram anos a especializar-se no estrangeiro, e
cuja formação custou tanto dinheiro ao país? Vou mandá-los a limpar
porquinhos? E os conferencistas e estudiosos, que ano após ano têm
trabalhado no Programa de Reforma e Melhoramentos? Que lhes faço, se a sua
solução resolver tudo?

- Não sei - repetiu João, encabulado.

- O senhor percebe agora que a sua ideia não vem ao encontro daquilo de que
necessitamos? O senhor não vê, que, se tudo fosse tão simples, os nossos
especialistas já teriam encontrado a solução há muito tempo atrás? O senhor
com certeza compreende que eu não posso simplesmente convocar os
anemotécnicos e dizer-lhes que tudo se resume a utilizar brasinhas... sem
chamas! O que espera o senhor que eu faça aos quilómetros e quilómetros de
bosques já preparados, cujas árvores são tão especializadas que não dão
frutos nem têm folhas para dar sombra? Vamos, diga-me.

- Não sei, não senhor.

- Diga-me, em relação aos nossos três engenheiros em Suino-Piro-Tecnia, o
senhor não considera que sejam personalidades científicas do mais
extraordinário valor?

- Sim, parece que sim.

- Então!? O simples facto de possuirmos valiosos engenheiros em
Suino-Piro-Tecnia indica que o nosso sistema é muito bom. O que faria eu a
indivíduos tão importantes para o país?

- Não sei.

- Percebeu agora? O senhor tem é que trazer soluções para certos problemas
específicos, por exemplo: como melhorar as anemotécnicas actualmente
utilizadas, como obter mais rapidamente acendedores de Oeste (a nossa maior
carência), como construir instalações para porcos com mais de sete andares.
Temos que melhorar o SISTEMA, e não transformá-lo radicalmente, entende? Ao
senhor, falta-lhe sensatez!

- Realmente... eu estou perplexo! - Respondeu o João.

- Bem, agora que o senhor conhece as dimensões do problema, não ande por aí
a dizer que pode resolver tudo. O problema é bem mais sério e complexo do
que o senhor imagina. Agora, entre nós: devo recomendar-lhe que não insista
nessa sua ideia. Isso poderia trazer-lhe graves problemas a si e ao seu
cargo. Não por mim... o senhor entende. Eu digo isto para o seu próprio bem,
porque eu compreendo-o, entendo perfeitamente o seu posicionamento, mas o
senhor bem sabe que pode apanhar outro superior menos compreensivo, não é
assim?

João Bom-Senso, coitado, não disse nem mais um "A", sobre o assunto. Sem se
despedir, meio atordoado, meio assustado, com a sensação de estar a caminhar
de cabeça para baixo, saiu de fininho e nunca mais ninguém o viu. Por isso é
que ainda hoje se diz, quando há reuniões de Reformas e Melhoramentos, que
"falta o Bom-Senso".

Comentários:

Em maio 23, 2006 10:22 da tarde, Blogger Manel escreveu...

Se me pagarem , porque já estou farto de trabalhar á borla , sou capaz de descobrir:

O País onde aconteceu a estória

O Partido no poder

Os Chefes dos sindicatos

O Ministro da Economia

PS: Boa fábula

 

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